terça-feira, setembro 12, 2006

Vertigo


Em mim possuía as sementes da minha própria derrota. Sou inferior à minha sombra, à minha ideia, à ideia que fazes de mim. Como é fútil, tentei lutar e saí derrotada por ela, nunca a superarei. Não me ames pelo beirame, disse-te, Joane, como o do poema, mas é tudo um exercício fútil. No mundo a preto e branco dos sonhos a minha sombra vem por detrás de mim, à traição e desfere o golpe. Não a posso ferir, pois não existe, não a posso derrotar, porque está inatingível, não poderia crescer até ao que ela é, porque não é humana. Não bebas as minhas palavras, disse-te a ti, Joane, como o do poema. Estás bebâdo delas. E elas permanecem enquanto eu cresço e mudo e envelheço, um corpo-caroço da alma que te interessa, um resíduo. Derrotei-me a mim mesma porque me amas em efígie. Amas-me em metalinguagem. Amas-me pelo beirame, Joane, para lá da minha vulgaridade, da minha humanidade, das minhas fraquezas. Viverei sempre em ti quando nunca aspirei a mais senão viver contigo. Serei eterna como um símbolo ou uma deusa, mas não serei amada. Amas-me pelo beirame, Joane, por aquilo que construo e as palavras que alinho. Amas-me pelas sombras. Nunca percebeste: de ti não quis a eternidade, mas a presença. Não a abstracção do somewhere, some place, there's a place for us. Não viste, Joane como sou viva e real, amaste-me pelo beirame, Joane. E isso nunca te poderei perdoar.

1 comentário:

sem-se-ver disse...

passei por aqui e gostei muito.

mesmo.

abraço